domingo, 20 de março de 2011

Canto para a minha morte

"Eu sei que determinada rua que eu já passei
Não tornará a ouvir o som dos meus passos.
Tem uma revista que eu guardo há muitos anos
E que nunca mais eu vou abrir.
Cada vez que eu me despeço de uma pessoa
Pode ser que essa pessoa esteja me vendo pela última vez
A morte, surda, caminha ao meu lado
E eu não sei em que esquina ela vai me beijar


Com que rosto ela virá?
Será que ela vai deixar eu acabar o que eu tenho que fazer?
Ou será que ela vai me pegar no meio do copo de uísque?
Na música que eu deixei para compor amanhã?
Será que ela vai esperar eu apagar o cigarro no cinzeiro?
Virá antes de eu encontrar a mulher, a mulher que me foi destinada,
E que está em algum lugar me esperando
Embora eu ainda não a conheça?


Vou te encontrar vestida de cetim,
Pois em qualquer lugar esperas só por mim
E no teu beijo provar o gosto estranho
Que eu quero e não desejo,mas tenho que encontrar
Vem, mas demore a chegar.
Eu te detesto e amo morte, morte, morte
Que talvez seja o segredo desta vida
Morte, morte, morte que talvez seja o segredo desta vida


Qual será a forma da minha morte?
Uma das tantas coisas que eu não escolhi na vida.
Existem tantas... Um acidente de carro.
O coração que se recusa abater no próximo minuto,
A anestesia mal aplicada,
A vida mal vivida, a ferida mal curada, a dor já envelhecida
O câncer já espalhado e ainda escondido, ou até, quem sabe,
Um escorregão idiota, num dia de sol, a cabeça no meio-fio...


Oh morte, tu que és tão forte,
Que matas o gato, o rato e o homem.
Vista-se com a tua mais bela roupa quando vieres me buscar
Que meu corpo seja cremado e que minhas cinzas alimentem a erva
E que a erva alimente outro homem como eu
Porque eu continuarei neste homem,
Nos meus filhos, na palavra rude
Que eu disse para alguém que não gostava
E até no uísque que eu não terminei de beber aquela noite...
Vou te encontrar vestida de cetim,
Pois em qualquer lugar esperas só por mim
E no teu beijo provar o gosto estranho que eu quero e não desejo,mas tenho que encontrar
Vem, mas demore a chegar.
Eu te detesto e amo morte, morte, morte
Que talvez seja o segredo desta vida
Morte, morte, morte que talvez seja o segredo desta vida"


Gostei muito! Raul sempre maravilhoso!
A cada dia que passa tenho mais certeza que não é mais um dia de vida, e sim menos um, e o que eu farei com o meu amanhã só saberei quando o sol raiar. Por isso, o hoje, o agora... eu pelo menos tento fazer com que seja bom, que seja o melhor. Pode ser que o melhor em um certo dia seja sair correndo e dançando, n'outro dia pode ser ficar quieta no meu canto escrevendo. Mas já sei que tenho sempre que deixar as coisas boas ao meu redor, vale a pena pra mim no exato instante, e resultará algo bom para caso eu viva o amanhã.
E se o amanhã não existir, se a morte me pegar meio que sem jeito na próxima esquina... eu saberei que tentei melhor viver cada instante... da forma mais simples ou mais complexa, mas jamais deixei de ser o que eu sou, ainda que eu passe a vida inteira sem saber exatamente a minha definição.
Parei pra pensar nisso esses dias. A cada dia que passa eu busco responder pra mim 'O que sou?', 'O que eu quero?', 'O que fui?', 'Sou feliz?'. Questionamentos que me fazem sentindo em algumas vezes, e n'outras nem um pouco. E a cada dia encontro uma resposta diferente, umas com mais questionamentos, outras quase definitivas; mas sempre algo novo. Então, se nem eu consegui encontrar uma resposta para mim, se ainda não me conheço, e faço um descoberta nova a cada manhã... como pode outra pessoa me conhecer? Não, não me conhece. E isso eu quero deixar claro, Ninguém me conhece. Nem eu. Então, peço que não busquem me definir, isso me limitaria a uma opinião de alguém. E nasci livre, sou livre. Nenhum pássaro deveria ser privado de sua liberdade de voar pelos céus, descobrindo novos ares, e cantando melodias desconhecidas. Até que um dia... naturalmente, sua voz seja calada, e suas asas, sem força, não possam mais voar. Mas, VOCÊ não pode interferir nisso.

Nenhum comentário:

Postar um comentário